Numa versão um pouco diferente, Miséria é uma velha e pobre mulher que...
Esta é uma história da tradição oral portuguesa e espanhola que já foi recontada por diversos autores e que pode ser lida em Antologia de Contos Populares de Alexandre Parafita (Plátano Editora, 2001) e ouvida em http://www.estudioraposa.com/audio/historia_36.mp3
Ou então...
... lida aqui mesmo na minha própria versão, especialmente construída para vós:
Queixava-se a tia Miséria
Da sua desgraça tamanha,
De ser pobre, de ser velha
E da saúde que não há,
Não permitir a façanha,
De à pereira da horta
Subir como um rapaz
E nela encher um cabaz
De fruta que se coma,
Seja madura, seja verde,
Seja boa, seja má.
E dos rapazes se queixa
Que, malandros, a atormentam
Pois nos ramos da pereira se sentam
E da velha (que não os deixa)
Riem e troçam com maldade
Enquanto os bolsos e o papo
Vão enchendo com aparato.
E a velha bem se zanga
Mas nada pode fazer
Pois, de um salto, a garotada
Parte, de barriga inchada,
Pelos campos, a correr.
Um dia vem um pedinte
Pedir, à velha, abrigo.
E esta, sem hesitar
Por uma fresta do postigo
Mandou o mendigo voltar
Ao caminho que trazia
Dizendo que não havia
Em sua casa, lugar.
Uma enxerga para dormir
Era tudo o que pedia
Pois que logo, ao amanhecer,
Tornaria a caminhar
E à velha prometia
Um desejo conceder
Se o deixasse ficar.
Ao ouvir esta promessa
A velha teve uma ideia malvada.
Abriu a porta depressa
E pensou que poderia
Usar o desejo do pobre
Para prender a garotada
Que à pereira subia.
E assim aconteceu!
Os petizes da aldeia
Tiveram a triste ideia
De à pereira trepar.
E na descida dos ramos
Sentiram-se enredar
Por lianas que prendiam
Suas pernas e seus braços
Sem os poderem soltar.
Pediram ajuda à velha
Para poderem descer
E esta os fez prometer
Que nas peras da sua pereira
Não voltassem a tocar.
Assim, sob juramento,
Foram embora, os rapazes
Depois de encherem dois cabazes
Com os frutos da pereira.
Passaram dias e meses
E numa noite de luar
A velha ouviu chamar
Pelo seu nome, na rua.
Viu, a claridade da lua
A figura negra da Morte
Que lhe indica sua sorte
E que antes da noite findar
A teria que levar.
A velha rogou à Morte
Que antes que a sua hora viesse,
Da sua pereira querida,
Uma pêra lhe colhesse,
Agora amadurecida.
É que ela, de tão velha
Não podia lá subir
E de desejos morria
Se uma pêra não comia.
E ainda haviam de dizer
Que veio a Morte de longe
Matar uma velha já morta
Por, a desejos, não resistir
De uma pêra comer.
A Morte trepou à pereira
E ficou presa nos ramos
Até que, da aldeia inteira
E de todo o mundo também,
Vieram gentes em prantos
Pedir à velha que a solte
Do feitiço que a retém.
A velha disse que não
Sem hesitar um momento.
Não libertaria a Morte,
Até que esta, em juramento
Alterasse a sua sorte.
E assim vive a Miséria
Com promessa bem firmada
Enquanto o mundo for mundo
Não será incomodada.
E concedido o desejo,
Alterada sua sorte
Vemos pelo mundo inteiro
Bem amigas, de mãos dadas,
Estas duas almas penadas
Que são a Miséria e a Morte.
Olá Jorge,
ResponderEliminarGostei de visitar o teu blogue.
E quanto à miséria e a morte, depois pessoalmente verbalizo.
Ana Maria LOpes
Entrei, gostei, por cá voltarei!
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